O segundo ato - Paulynne Alves

A agulha da vitrola passando no disco arranhado

Que já não toca mais música, me acorda.

As tardes de Outubro se foram, e com elas você.
O sobrado já não possui mais os gerânios na janela.   
A platéia já não aplaude mais nossos corpos nus.
A fumaça de cigarro barato que me inebriava, me incomoda.
Seus livros italianos que me excitavam, estão espalhados por toda casa.
Você está espalhada pela casa!

Seu cheiro no lençol branco desarrumado.
Sua imagem na janela,
E nosso amor.
Sim, ele permanece por toda a casa e em todo meu ser.

Às vezes te vejo dançando pelos cômodos, cantando Lucio Battisti.
Gritando pra que eu levante da cama e veja como o dia está lindo.
Você não sabe, mas é você, e não o dia.

Falácia!
Tudo não passa de vários goles de whisky,
E de lembranças.

Não canso, pequena.
Eu, que nem fé tinha, tenho rezado todas as noites pra que você volte.
Quem sabe no próximo Outubro.
Eu espero...
Mas tenho fome.
Fome de você!

Ando por esquinas tentando te encontrar.
Tentando encontrar aonde você se perdeu.
Aonde eu te perdi.

Encontrei várias de você, admito.
Putas, sujas, casadas, apaixonadas, lindas, feias, gordas, magras.
Lábios e peles, sexo e gosto.
Todas loiras.

Amei cada uma delas.
Amei até evidenciar que apesar de parecer,
Faltava-lhes a pinta pequenina no meio das costas,
E a vontade inelutável de viver cada instante como se fosse à última vez.

Como se fosse à última vez...
 Não quero uma última vez!

Talvez seja apenas um vagão desgovernado que se desvinculou do resto do trem.
Talvez esse vagão, seja a cabine principal.
Talvez você não tenha ido embora,
E isso ainda seja efeito do whisky.          
Talvez...      

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